Monday, August 10, 2020

Abri...a janela ...reabri o blog.

 "Abri a janela e me ensopei de paisagem".

(João Anzanello Carrascoza ) 

Retornando ao meu bloguezinho hoje,em um dia de saudade, dia "10 de agosto" ,data em que meu querido pai comemora seu niver no céu.

"Saudades inteiras, porque não há saudade pela metade.Saudades a gente sente a qualquer hora,como a vida. A vida é - e também o que já foi - , a qualquer hora", diz o escritor  Carrascoza em "Menina Escrevendo Com Pai".



 Até amanhã...

 

In teste com esse novo template,

 10/8/2020




Thursday, November 10, 2016

"Milagres"


Imagem com licença poética: "Miracle"

Ora,quem acha que um milagre é alguma coisa de especial?  
Por mim, de nada sei que não sejam milagres: 
ou ande eu pelas ruas de Manhattan, 
ou erga a vista sobre os telhados 
na direcção do céu, 
ou pise com os pés descalços 
bem na franja das águas pela praia, 
ou fale durante o dia com uma pessoa a quem amo, 

ou à mesa tome assento para jantar com os outros, 
ou olhe os desconhecidos na carruagem 
de frente para mim, 
ou siga as abelhas atarefadas 
junto à colmeia antes do meio-dia de verão 
ou animais pastando na campina 
ou passarinhos ou a maravilha dos insectos no ar, 
ou a maravilha de um pôr-de-sol 
ou das estrelas cintilando tão quietas e brilhantes, 
ou o estranho contorno delicado e leve 
da lua nova na primavera, 
essas e outras coisas, uma e todas 
— para mim são milagres, 
umas ligadas às outras 
ainda que cada uma bem distinta 
e no seu próprio lugar. 

Cada momento de luz ou de treva 

é para mim um milagre, 
milagre cada polegada cúbica de espaço, 
cada metro quadrado da superfície da terra 
por milagre se estende, cada pé 
do interior está apinhado de milagres. 

O mar é para mim um milagre sem fim: 

os peixes nadando, as pedras, 
o movimento das ondas, 
os navios que vão com homens dentro 
— existirão milagres mais estranhos?

(Wall Whitmann in "Milagres")  



Disclaimer.
Em razão do resultado das eleições que  escolheram "Trump" como "triunfador" do pleito, selecionei hoje  Wall Whitmann, (link) que foi profundamente identificado com os ideais democráticos da nação americana. 



Para ser ouvido ao som de ♫♫♫




Recadinho  
 Temporariamente, o link dos comentários não será disponibilizado. 
Desculpem.
 Um beijo
Lau
Imagem: Miracle, by Pixdaus 

Saturday, November 5, 2016

" Não Há Vagas"

 Imagem com licença poética

O preço do feijão 
não cabe no poema. 
O preço do arroz 
não cabe no poema. 
Não cabem no poema o gás 
a luz o telefone 
a sonegação 
do leite 
da carne 
do açúcar 
do pão 

O funcionário público 
não cabe no poema 
com seu salário de fome 
sua vida fechada 
em arquivos. 
Como não cabe no poema 
o operário 
que esmerila seu dia de aço 
e carvão 
nas oficinas escuras 

- porque o poema,senhores, 
   está fechado: 
   "não há vagas" 

  O poema,senhores, 
   não fede 
   nem cheira 

(Ferreira Gullar,  in "Não Há Vagas" ) excerto


Escolhi Gullar em protesto às medidas "inconstitucionais" que foram anunciadas pelo governo do Estado do Rio de Janeiro,(link)  Além de medidas desumanas, (link) ainda querem confiscar o salário do pobre coitado aposentado que percebe um salário pífio e ainda será obrigado a descontar 30% do que recebe.  
 "A humanidade,q é pouco sensível,não se angustia com o tempo, porque faz sempre tempo; não sente a chuva senão qdo não lhe cai em cima", diz Fernando Pessoa in  seu Livro do Desassossego.
Não me sinto enquadrada nessa humanidade que fica em cima do muro, faz uma média aqui, outra lá. 
Não  aos  covardes. Não aos maus políticos.Não aos governantes incompetentes.Não à tirania.Não ao Cinismo.Não à hipocrisia. Não aos "stalkers insistentes".
Não aos "pífios" (generalizando) .
Os fortes entenderão.


Para acompanhar a imagem, sonzinhos es-co-lhi-dos a de-dos .Lembro sempre de meu querido e saudoso pai  que citava Guevara, quando eu me rebelava : 
"Hay Que Endurecer, Pero Sin Perder La Ternura Jamás” . 

    Ei-los :)   
1-♫ 
2-♫ 
3-♫ 


 Desculpem a veemência.
Um beijo
Lau





Fonte: Ferreira Gullar -Antologia Poética 

Imagem  " Não Há Vagas"/ No Vacancies  com licença poética / captada na Web.

Monday, October 31, 2016

E hoje é o Dia "D"ele...

(1970) Drummond e Caetano
Imagem com licença poética

Provisoriamente não cantaremos o amor,
que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos.
Cantaremos o medo, que esteriliza os abraços,
não cantaremos o ódio, porque este não existe,
existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro,
o medo grande dos sertões, dos mares, dos desertos,
o medo dos soldados, o medo das mães, o medo das igrejas,
cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos democratas,
cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte.
Depois morreremos de medo
e sobre nossos túmulos nascerão flores amarelas e medrosas

 (Carlos Drummond de Andrade (link do IMS) in Congresso  Internacional do Medo)


Disclaimer 
Minha homenagem ao aniversariante do dia( quase que não sai por falta de tempo, mas saiu). Ao Drummonzinho,meu eterno parceiro aqui no blog,a quem meu querido e saudoso pai teve a alegria de conhecer.Drummond,o poeta mais influente do século XX.
 Drummond querido,irônico ( ironia inteligente,única,não vulgar) poeta insubordinado, idolatrado por muita gente.
Posso imaginar como o céu está hoje: re-ple-to de nuvens de poesia.
E com seletos convidados:
 Manoel de Barros; Borges;Bandeira;Quintana;Vinicius;Tom;velho Guima; Ariano Suassuna; Pessoa;Castro Alves; Leminski;Cecília;Cora Coralina;João Cabral de Melo Neto;Gregorio de Matos ... meus pais, o Tricolor dos Pampas, o poeta de POA, o Antonio Campos (o de verdade), Áurea, a poetisa das tertúlias ... e por aí segue a lista de Grandes que já partiram para a eternidade.
Parabéns, Drummond!!
 Pegando carona em suas palavras,"mesmo no silêncio e com o silêncio,dialogamos".
Um beijo
Lau


Drummond, in 'Poema de Sete Faces'. (excerto)

Aqui, a última entrevista de Drummond ao jornalista Geneton Moraes Netos,que virou estrelinha recentemente.  Já aqui,  13 curiosidades sobre o enorme poeta e escritor.



Os sons estão aqui e aqui.
(Drummond se amarrava num tango)

 Boa noite
 Boa semana
 Lau







Imagens captadas na Web.
Disclaimer já publicado no blog.


Saturday, October 29, 2016

"Vem"... (Série Drummond Dia "D" 2016)


 A mulher do Intendente-Geral saiu de casa pela manhã para ir ao cabeleireiro,mas ao cabeleireiro ela não chegou.

A meio caminho viu o bando de crianças que dançava em torno de um mico,e o mico tocava rabeca. Ficou tão encantada com a alegria que resolveu incorporar-se ao grupo, e lá permaneceu dançando. Dançando e cantando, como todos faziam.

Juntou gente na praça,e o Inspetor de Veículos, escandalizado, foi avisar ao Intendente-Geral que sua excelentíssima esposa tinha regredido à infância.

O marido correu ao local e, com severidade,chamou a mulher ao respeito das conveniências Ela estendeu-lhe os braços,sorrindo e dizendo-lhe:"Vem".Mas o Intendente Geral não quis atendê-la e saiu furibundo rs ,exclamando que daquele  momento em diante não era mais casado.

Imagem com licença poética 

O mico da rebeca, sempre tocando,afastou-se, e as crianças o foram seguindo.A mulher do Intendente-Geral, também.À proporção que caminhavam,ela ia ficando do tamanho das meninas, e quando sumiram na volta da estrada era uma criança igual às outras.Dançando e cantando.

(Carlos Drummond de Andrade (link)in " O Poder De Uma Rabeca".)



Disclaimer

 Dando sequência às homenagems que já faço anualmente a Drummond em seu mês de aniversário,(31/10)hoje usarei as próprias  palavas do escritor e poeta para apresentar,mais uma vez,  o livro Contos Plausíveis:
"Esses contos (serão contos?) não são plausíveis na acepção latina de merecerem aplausos.São plausíveis no sentido de que tudo neste mundo, e talvez em outros, é crível, provável,verossímil. Todos os dias a imaginação humana confere seus limites,e conclui que a realidade ainda é maior do que ela.Não posso dizer, verdadeiramente ,que os escrevi.Escreveram-se no dia a dia do Jornal do Brasil,sem a intermediação de forças misteriosas.Queriam existir como estórias,ocuparam papel e hoje formam livro. (Carlos Drummond de Andrade )
Quem quiser relembrar mais homenagens ao cético Drummond,de outro outubro,pode clicar aqui (post muito procurado, por sinal ) Há outra  aqui . Aqui  há um outro post  "top" .
É só jogar na "lupinha" do blog que outros contos  de Drummond podem ser lidos.
Obrigada.

 


Em consonância com  o título do post ,o soundtrack aqui  (Desculpem, o link anterior estava quebrado)

Bom domingo aos leitores amigos.
 Beijo
Lau




Imagens com licença poética: 
1-  Revista  @Time
2 - Amarelinha" de Aldemir Martins (link)em colagem com uma "rabeca" *  (link) (colagem by euzinha, no Picasa)

Thursday, October 27, 2016

E o encho de algodão, de paina, de doçura ... (Série Drummond Dia "D"- 2016)

Imagem com licença poética

Fabrico um elefante
de meus poucos recursos.
Um tanto de madeira
tirado a velhos móveis
talvez lhe dê apoio.
E o encho de algodão,
de paina, de doçura.

A cola vai fixar
suas orelhas pensas.
A tromba se enovela,
é a parte mais feliz
de sua arquitetura.

Mas há também as presas,
dessa matéria pura
que não sei figurar.
Tão alva essa riqueza
a espojar-se nos circos

sem perda ou corrupção.
E há por fim os olhos,
onde se deposita
a parte do elefante
mais fluida e permanente,

alheia a toda fraude.
Eis o meu pobre elefante
pronto para sair
à procura de amigos
num mundo enfastiado
que já não crê em bichos
e duvida das coisas.

Ei-lo, massa imponente
e frágil, que se abana
e move lentamente
a pele costurada
onde há flores de pano
e nuvens, alusões
a um mundo mais poético
onde o amor reagrupa
as formas naturais.

Vai o meu elefante
pela rua povoada,
mas não o querem ver
nem mesmo para rir
da cauda que ameaça
deixá-lo ir sozinho.

É todo graça, embora
as pernas não ajudem
e seu ventre balofo
se arrisque a desabar
ao mais leve empurrão.

Mostra com elegância
sua mínima vida,
e não há cidade
alma que se disponha
a recolher em si
desse corpo sensível
a fugitiva imagem,
o passo desastrado
mas faminto e tocante.

Mas faminto de seres
e situações patéticas,
de encontros ao luar
no mais profundo oceano,
sob a raiz das árvores
ou no seio das conchas,
de luzes que não cegam
e brilham através
dos troncos mais espessos.

Esse passo que vai
sem esmagar as plantas
no campo de batalha,
à procura de sítios,
segredos, episódios
não contados em livro,
de que apenas o vento,
as folhas, a formiga
reconhecem o talhe,
mas que os homens ignoram,
pois só ousam mostrar-se
sob a paz das cortinas
à pálpebra cerrada.

E já tarde da noite
volta meu elefante,
mas volta fatigado,
as patas vacilantes
se desmancham no pó.

Ele não encontrou
o de que carecia,
o de que carecemos,
eu e meu elefante,
em que amo disfarçar-me.
Exausto de pesquisa,
caiu-lhe o vasto engenho
como simples papel.

A cola se dissolve
e todo o seu conteúdo
de perdão, de carícia,
de pluma, de algodão,
jorra sobre o tapete,
qual mito desmontado.
Amanhã recomeço.

(Carlos Drummond de Andrade,o aniversariante do mês, in "Elefante")



Disclaimer

Duvidoodó que não haja uma pessoa que passe por aqui que não tenha um elefante em casa. Falo por mim que sou a-pai-xo-na-da por elefantes.Tenho uma coleção de bibelôs-elefantes,de telas, chaveiros, cadernos,agendas,dois relógios e outros penduricalhos.
Só Freud pra explicar essa fixação nesse bichinho tão grande no tamanho,na lindeza e nas suas peculiaridades.
Os elefantes possuem  o maior cérebro entre todos os mamíferos.Sua inteligência e memória são muito boas.Li um dia desses que os elefantes possuem uma capacidade de compreensão naturalmente  e são muito mais parecidos conosco do que  pensávamos.Conhecidos como solidários,são realmente preocupados com o bem-estar de seus companheiros de manada.Se alguém estiver passando por um momento complicado, prontamente seus amigos o confortarão.São corajosos. 
Bom seria que entre os humanos  sempre  houvesse essa solidariedade que há entre os elefantes,né não?  Além  da sociabilidade,da amizade,são divertidos e  companheiros. E mais: afastam a negatividade e dão sorte. Uhu! 
 Com todo o tamanhão do animal ,alguns chegam a pesar toneladas,sinto-os e vejo-os tal qual Drummond em seu poema : 
de uma  leveza de "algodão,de paina,de doçura"...
Sejamos elefantes nem quem seja por um dia.

 Um beijo 
Lau   



Recadinho
Não teremos soundtrack em respeito à passagem,a ida para o céu do Grande Capitão da Seleção Brasileira, o famoso "Capita" Carlos Alberto Torres, (link) que nos deixou há 2 dias.Ao  ler a declaração de seu filho (link) vê-se que o "capita" possuía o espírito solidário dos elefantes.
R.I.P. Grande Carlos Alberto Torres !! ♥





Aqui, o elefante de Drummond na voz de Adriana Calcanhoto.
Fonte: A Rosa do Povo -Andrade, Carlos Drummond de -Companhia Das Letras.pág.47
Imagem by @Benelephants

Monday, October 24, 2016

" Romancetes" - (Série Drummond Dia "D" 2016)



Arte de Rafal Olbinski
Imagem com licença poética

I
A Rainha das Formigas ocultou-se 
no monte-de-vênus de Miss Universo.
Todos pensaram que esta se tornara ninfomaníaca.
II
A flor da insônia, de pétalas espinhentas,
viceja nos jardins e nas democracias 
e nenhum policial a percebe.
III 
Na rua, mostro 
as pernas normais,
porém na intimidade
uso as amputadas.
IV 
Quinhentos homens precipitam-se  
sobre a Virgem de Salerno 
e, na confusão,
servem-se uns aos outros,
deixando a presa intata.(1)
V
Os maus espíritos introduzem-se
na conversa, em forma de moscas.
Seus zumbidos apoiam ora um ora outro
interlocutor;babel.
VI
A molécula da memória, extraída 
do cérebro de um rato,
inoculada no morto
cria nele um sistema perfeito de vivência 
que faz vibrar o cemitério.

(Carlos Drummond de Andrade,(link) in Romancetes)


Recadinho de 2016  
Neste mês de outubro,mês do niver do meu parceiraço,Drummonzinho,o Renascendo pretende fazer homenagens,quase que diariamente,ao escritor e poeta .
Assim como o Bloomsday, comemorado em 16 de junho na Irlanda,com exaltações à vida e obra de James Joyce, dia 31 de outubro próximo será lembrado o niver de Carlos Drummond de Andrade ,ocasião em que todos os parabéns serão poucos para esse poetaço considerado o mais influente poeta brasileiro do século XX.
Aquele que diz que entende poesia como "um negócio de responsabilidade, e não considera honesto rotular-se de poeta  quem apenas verseje  por dor de cotovelo". 
Eita!! Esse Drummond sabe das coisas. 
Viva Drummond!!! 
No Renascendo as homenagens começam hoje e com obras do livro Farewell ,do poeta insubordinado,do Grande Drummond. 
Grande homem!! Corajoso!! Esperto!!  Independente!!! Inesquecível ! 

O soundtrack do dia está aqui. 

Um beijo aos amigo queridos que me visitam
Uma semana produtiva a todos.
Lau ♥


1-  intata = Diz-se de algo ou alguém que não foi tocado.
Que não sofreu alteração; que não foi estragado; ileso: ex:  apesar do terremoto a cidade manteve-se intata.


Fonte: Carlos Drummond de Andrade in Farewell,  pág. 119- Editora Record.